sexta-feira, 24 de julho de 2009

Ceticismo...Parte I

Após longa ausência, vou retomar o assunto “ceticismo”. Eu sei que parece esquisito alguém gostar tanto desse assunto, mas pretendo escrever alguns posts que espero demonstrem a importância de se discutir sobre isso, e aí tenho a pretensão de desmistificar um pouco essa palavra, que compreensivelmente é usada de forma pejorativa pela maioria das pessoas. Sempre que digo que sou um cético, observo aquela expressão entre estranheza e nojo nas pessoas, já que invariavelmente associam ceticismo com falta de um padrão moral rígido (alguém que não acredita em nada, e portanto consideraria qualquer comportamento justificável, ou então é aquele chato que está sempre buscando “buracos” nas crenças alheias). Esse é o tipo de cretinice motivada por ignorância, que espero reduzir nos próximos posts...
No post anterior já falei que o ceticismo pode nos livrar de constrangimentos. Mas só por isso alguém deve ficar insistindo que devemos exercitar nosso ceticismo? Não. Isso é o de menos. O que é muito importante é compreender que tomamos nossas decisões baseadas em nossas crenças, ou seja, aquilo que acreditamos afeta completamente nossos julgamentos, influencia nossas ações e portanto define nosso destino. Então aquilo que acreditamos afeta tudo. E a relação entre “exercitar o ceticismo” e “nossas crenças” não poderia ser mais íntima. Portanto, CQD, uma boa dose de ceticismo é vital...

Definição de cético: pessoa que mantém a mente aberta, mas quer ver e avaliar as evidências, exigindo investigação rigorosa antes de acreditar no fato...

Mas não seria tão importante exercitar o ceticismo caso fossemos naturalmente programados para avaliar corretamente as informações que nos passam. E o que ocorre infelizmente é o oposto...temos a tendência a avaliar erradamente o que chega até nós. E por isso todos carregamos crenças absurdas, e somos facilmente enganados. Por exemplo, responda: o que é mais perigoso, ter uma piscina ou uma arma em casa? Se você, como eu, respondeu arma, erramos juntos. E sabe porque? Por que preferimos histórias dramáticas à estatísticas. Mais pessoas morrem no mundo em acidentes caseiros com piscinas do que com armas. Mas ler sobre o garoto que baleou a cabeça de sua irmãzinha é bem mais atordoante...E mais pessoas morrem por picadas de abelhas no mundo que em acidentes aéreos...Mas quem gosta de avaliar estatísticas? E pior, quem tem noção de estatística? (li esses dias que um ex-presidente norte-americano ficou horrorizado quando soube que metade das crianças de seu país tinha inteligência abaixo da média!! Algo precisava ser feito!!). Quantos de nós deixa de comprar um carro porque um amigo disse que teve problemas com o dele, mesmo após verificar em pesquisas que aquele é um dos mais confiáveis modelos existentes? Um relato apenas detona uma pesquisa feita numa base bem maior de dados.
Fomos programados para gostar de histórias, e por milhares de anos ouvir relatos foi a única forma de obter informações...
Além de preferir histórias, detestamos o acaso. Essa é outra palavra demonizada pela maioria das pessoas. Detestamos a idéia de que algo ocorra por simples coincidência. Queremos acreditar que controlamos tudo a nossa volta, e aquilo que nos escapa com certeza teve uma causa. Tudo tem que ter propósito...e isso nos faz mais vulneráveis a acreditar em coisas bizonhas...
Achei muito interessante esse exemplo, retirado do livro “Não Acredite em Tudo o Que Você Pensa”: vamos ganhar dinheiro fazendo as pessoas acreditarem que temos a habilidade de prever as oscilações da Bolsa de Valores (isso vale pra qualquer charlatanismo...). Enviaremos uma carta para 2000 pessoas, que sabemos possuem renda para aplicar em ações. Em metade delas informamos que as ações da Vale irão subir na semana seguinte, e na outra metade que irão cair. Dessa forma, 1000 pessoas receberão uma carta curiosamente premonitória. Ficamos só com essas 1000, e para 500 enviamos carta dizendo que as ações irão subir novamente, e para as demais que irão cair. Depois de duas semanas, 500 pessoas receberam duas cartas seguidas com informação correta e preciosa! Mais duas semanas, e teremos 125 pessoas absolutamente convencidas dos seus poderes, e aceitarão depositar R$ 200,00 na sua conta em troca da próxima dica! Embolsaremos R$ 25.000,00 sem sair de casa, apenas porque as pessoas não podem aceitar que 4 resultados corretos seguidos não seja prova de superpoderes...
E isso acontece o tempo todo...tratamos as coincidências como algo extraordinário, e não aceitamos que muitas coisas ocorrem por puro acaso...e uma das causas disso (eu também sou fanático por "causas"...rsrs) é que o ensino de estatística e probabilidade nas escolas é insuficiente para nos ajudar a analisar as informações e a tomar decisões mais sensatas.
Outro fator que nos leva a tirar conclusões erradas é nossa tendência a confirmar aquilo que já acreditamos, ou seja, prestamos atenção às informações que corroboram nossas teses, e procuramos ignorar quando são contrárias...mas isso fica para o próximo...

George Bernard Shaw
"Dizer que um crente é mais feliz do que um cético é como dizer que um bêbado é mais feliz que um sóbrio. "
Anatole France
"Se 50 bilhões de pessoas acreditam em uma coisa estúpida, essa coisa continua sendo uma coisa estúpida."